Cultura de Libertação – Uma escola de artes para quê?

Essas frases foram retiradas de conversas que tive com a maior parte dos professores e professoras, além de pessoas envolvidas com o funcionamento da Escola de Artes de Mossoró.

Por Dionízio do Apodi

“Um filho que nasceu dentro de casa e não é incluso nas ações culturais praticadas pela Prefeitura”. “A gente fala e os nossos gestores não entendem. Eles tapam a vista para a realidade da Escola”. “Não há um orçamento voltado para atender as demandas dos professores e alunos. Tem professor que não tem material para trabalhar”. “Desde sua fundação que a escola se mantém com o dinheiro das matrículas dos alunos, que acontecem uma vez por ano. Nós não somos vistos como profissionais que tem uma função importante, que é possibilitar no aluno o encontro com a arte e com a cultura”. “Tem muita gente que não é artista lá dentro, não sabe como é a rotina de um músico, de um pintor, de um ator, e isso dificulta. Tem gente trabalhando lá que não gosta daquele ambiente, e isso é danoso”.

Essas frases foram retiradas de conversas que tive com a maior parte dos professores e professoras, além de pessoas envolvidas com o funcionamento da Escola de Artes de Mossoró.  Mostram o que eu já alertava em 2012, quando a prefeita da época, Fátima Rosado, criava, numa antiga escola municipal, o equipamento a que nos referimos. Naquele ano, escrevi textos, dei entrevistas, conversei com pessoas, falando da falta de condições do local para receber algo tão importante como uma escola de artes. Para abafar minhas críticas e de algumas pessoas que também demonstravam essa preocupação, os donos do poder na época espalharam, pelos jornais, que éramos contra a criação da escola. Nunca fui contra, mas sempre tive visão crítica, o que me ajudou a constatar que a escola funcionaria com muita dificuldade. É como ganhar um carro sem as quatro rodas. Para tirar esse carro do lugar requer muita luta, briga e esforços. É necessário primeiro botar as rodas para o carro andar.

Em um manifesto do Movimento Ventania, do qual fiz parte, no mesmo ano da criação da Escola, constava: “exigimos que a Escola de Artes de Mossoró seja devidamente equipada com tablados para as salas de dança e teatro, e tratamento acústico para as salas de música”. Em 2014 o mesmo Movimento entregou uma carta para o então prefeito Silveira Júnior com dez pontos urgentes para serem tratados pela Prefeitura Municipal. E um deles era a “realização de um seminário pelos grupos e artistas para rever o formato das ações da Escola de Artes de Mossoró, bem como sua adequação física, que entendemos como fundamental para a realização das ações”. Mas nosso Movimento virou chacota nos veículos de comunicação que a Prefeitura mantinha sua propaganda. O poderio de Gustavo Rosado, irmão da prefeita daquele tempo, era tão grande que fazia até gente de luta vendar os olhos e não enxergar o que apontávamos.

O tempo passou. E a realidade nos mostra uma Escola de Artes mergulhada  nos problemas que queríamos discutir naquela época mas que foram abafados pela vinda do ator Stênio Garcia (artista maravilhoso mas sem conhecimento do que vivíamos). Trago essa lembrança para nos ajudar a pensar, sempre, no que está por trás de cada ato oficial. Por trás da foto de inauguração com Stênio Garcia havia muita coisa para ser discutida e realizada. Mas os gestores não têm tempo e interesse em passar pelas etapas necessárias. A pressa em ter algo que possa sustentar uma placa com seus nomes, principalmente se for nas proximidades das eleições, é a maquiagem para o nosso povo.

A situação da cultura, mas podemos ir para os outros contextos também, é tão crítica, porque não temos nada, que quando nos prometem uma coisa, recebemos até pela metade, como no exemplo do carro sem rodas. E se a Escola de Artes tivesse sido inaugurada um ano depois, nem no antigo colégio seria, bastaria inaugurar uma maquete, pois em 2013 foi iniciada, nas gestões municipal e estadual, a temporada de inauguração de maquetes, que juntava gestores, bajuladores, meios de comunicação pagos, artistas, em torno de uma maquete de alguma obra. Veja a Praça da Ciência no Governo Fátima Rosado, o Teatro Lauro Monte Filho, com Rosalba, o Estádio Nogueirão, e por aí vai.

A publicidade é a forma de enganar o povo. O poder cria o fato positivo e espalha através de propaganda paga com o dinheiro público, no rádio, na TV, em blogs, outdoors, redes sociais… a repetição daquela informação causa um sentimento de que aquilo existe e que é daquele jeito. As gestões passadas fizeram e a gestão atual também já segue a cartilha, basta ver o que é gasto com publicidade. O Ministro da Propaganda de Hitler, era Joseph Goebbels, que teve papel decisivo na adesão da sociedade alemã ao projeto nazista. Ele dizia que uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade.

E assim assistimos as gestões antigas e atual, repetirem que a grandiosidade da cultura de Mossoró pode ser vista no Cidade Junina, que fica com a maior parte dos recursos destinados ao setor, deixando outras ações e manifestações, que acontecem ou poderiam acontecer durante o ano, à míngua. No Plano Plurianual 2022-2025, enviado pelo prefeito de Mossoró à Câmara, e que está em discussão, o Mossoró Cidade Junina aumenta seu orçamento a cada ano (quatro milhões e seiscentos mil em 2022, seis milhões e quinhentos mil em 2023, sete milhões em 2024 e sete milhões e quinhentos mil em 2025). Tudo isso é pensado, para que se tenha mais recursos à medida que as eleições se aproximam. Afinal de contas o Cidade Junina é o principal cabo eleitoral desses poderosos. Eles sabem.

Para a Escola de Artes, no mesmo Plano Plurianual 2022-2025 há um pouco mais de 170 mil por ano, e se você divide isso por doze meses, dá para ver como é pouco para uma escola que não tem salas apropriadas (como pode ocorrer um ensaio da Banda de Música Artur Paraguai tendo na sala ao lado um curso de violão, ou de teatro, ou de dança – que inclusive não tem professor?); não tem salas climatizadas; que precisa de cadeiras, livros, instrumentos, coisas básicas; não tem um auditório para fruição da produção artística da escola (que possui uma quadra de esportes sem uso); que não tem nenhuma sinalização de contratação de professores, porque no próprio município não existe o cargo de professor na Secretaria de Cultura; que abriga a Orquestra Sanfônica que não tem dinheiro para comprar sanfona; e que atende anualmente cerca de 900 alunos.

Mesmo assim, se não colocarem esses valores para outras áreas, o mais provável acontecer, é bem menos vergonhoso do que a gestão passada que teve o disparate de destinar duzentos reais para a manutenção da Escola de Artes.

O que acho mais triste por parte dos gestores de Mossoró e eu teria muita vergonha se fosse um deles, é que nesses anos todos a Escola de Artes não tem um Plano Pedagógico, não sabe, enquanto escola, para onde vai, quais são seus objetivos e porque está ali. Ficam os companheiros e companheiras que trabalham lá fazendo e torcendo para que as coisas deem certo. 

O Conselho de Cultura precisa ser ouvido pelo secretário de Cultura, o Professor Etevaldo. A notícia que recebo de conselheiros de cultura que estão lá, é de que o secretário utiliza o silêncio como resposta às indagações dos conselheiros. Observei uma série de ações da secretaria descritas no Plano Plurianual 2022-2025, como Festival de Dança, Cultura Itinerante, Capacitação de Grupos e Artistas locais, escola de audiovisual, biblioteca de literatura popular, dentre outros. Mas todas as ações precisam ser discutidas juntamente com o Conselho de Cultura, que está escanteado. Passamos do tempo em que as pessoas que estão à frente da secretaria de cultura, ficam criando coisas para depois serem lembradas como a mente que projetou aquilo. Gustavo fez isso, Isaura fez isso, todos fizeram. O professor Etevaldo poderia ser diferente. O que custa, professor, dialogar com o Conselho, ajudá-lo a ser um instrumento importante, e não desprezá-lo? Amanhã ou depois o professor sai do cargo e qual será o legado deixado para a cultura de Mossoró? Nenhum? Só evento, como fizeram os secretários e secretárias que passaram?

Eu sonho com uma Escola de Artes que possa chegar até a periferia e zona rural, com projetos de extensão, que circule, que dê oportunidade aos inúmeros talentos que são desperdiçados a cada dia, por falta de um incentivo. Sonho com uma Escola de Artes que possa renovar o cenário artístico mossoroense, que ajude a criar grupos em todas as áreas do município, que capacite gente nova para servir como técnicos dos equipamentos culturais. Sonho tanto! Mas como sonhar com isso se a Escola de Artes de Mossoró não tem o básico para funcionar? Como diz o mestre Antônio Francisco: é feito pra dar errado!

Pense, reflita, troque uma ideia com uma pessoa próxima! Ajude a transformar esta realidade! Quem puder, compartilhe esse texto com alguém!

Até o próximo domingo!

Abraços e há braços!

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